A agricultura brasileira não para de surpreender. De um importador de leite em pó da Holanda há 50 anos, é hoje um dos maiores exportadores de alimentos para todo o mundo. Este avanço, reconhecido universalmente como uma das grandes conquistas para fornecimento de alimentos para a humanidade, se deve a uma série de fatores, entre eles a natureza climática de nosso país, a propensão do agricultor e da indústria de insumos agrícolas para a inovação e, sem sombra de dúvida, a geração de conhecimentos e de tecnologias pelos órgãos de pesquisa.

Nas décadas de 1960 e 1970, as análises física e química dos solos ainda eram objeto de forte divulgação pelos órgãos de extensão, levando ao agricultor a informação da necessidade e se fazer as análises de solo. Com o correr dos anos estas análises, junto com as recomendações de adubação delas decorrentes, passaram a fazer parte da rotina dos agricultores brasileiros, tornando-se uma das ferramentas para as altas produtividades.

Mas aos poucos foi-se vendo que apenas isto não estava sendo suficiente para passar a patamares mais elevados. Faltava alguma coisa. Com a elevação dos conhecimentos de que o solo não era simplesmente um suporte para as raízes e um reservatório para os nutrientes químicos, mas sim um organismos vivo, com bilhões de microrganismos que  exercem inúmeras funções profundamente ligadas à nutrição vegetal, ao crescimento e à saúde das plantas, começou-se a estudar como avaliar a qualidade do solo, juntando o conhecimento de sua estrutura física e sua composição química ao fator microbiológico.

Durante um tempo a avaliação do teor de matéria orgânica era um dos únicos indicadores de vida no solo. Mas constatou-se que era insuficiente. Procurou-se analisar a composição microbiológica como um todo, medindo a emissão de gás carbônico e a microbiota do solo. Mas os resultados eram incertos, incoerentes, não se encontrando correlação com outros fatores, em especial com a produtividade.

Mas a pesquisa não para, o conhecimento evolui e, mais uma vez, a capacidade e a tenacidade de pesquisadores brasileiros criaram um método, expedito, barato e altamente confiável para se avaliar a saúde do solo como um todo, juntando os conhecimentos oriundos das análises química e física, com indicadores da atividade microbiológica.

O método Bio Análise do Solo, BioAS, desenvolvido na Embrapa Cerrados, em parceria com outras unidades da Embrapa, com a Fundação MT e com a participação de diversas fazendas produtoras de soja, em uma equipe liderada pela Pesquisadora Ieda Mendes, prospectou durante vários anos quais seriam os melhores indicadores para mostrar, em análises que permitiriam a entrada em testes de rotina, o estado de “saúde microbiológica” do solo. Através da análise da atividade de duas enzimas produzidas por microrganismos, o grupo chegou à identificação das enzimas Glicosidase e Sulfatase como indicadores da atividade microbiológica do solo.

A partir daí iniciou-se o caminho de transformar este conhecimento em ferramenta. Através de muitos e muitos ensaios de campo, foi buscada a correlação com níveis de produtividade, de macro e micronutrientes, de potencial de reciclagem de nutrientes. Finalmente, levando tudo isto à computação, desenvolvendo algoritmos próprios, os pesquisadores chegaram ao modelo de análise da atividade microbiológica do solo.

Mas mais do que mostrar um estado atual, uma fotografia instantânea, o método permite acessar a “memória do solo”, o que foi feito em termos de prática durante anos anteriores, se foi monocultura, se houve sucessões de cultivos ou rotação. E mais ainda: permite, com base na análise do passado e no estágio atual, prever o que poderá acontecer no futuro. Durante o lançamento da tecnologia pela Embrapa, neste mês de agosto, a pesquisadora fez uma comparação interessante:  uma pessoa que esteja em bom estado de saúde, sem nenhum sintoma, ao fazer uma análise de sangue, pode ter constatado algum indicador de futuros problemas de saúde. Com base neste dado, o médico poderá indicar tratamento para evitar que a doença venha a se instalar no futuro. No caso da agricultura, em um solo que esteja apresentando elevada produtividade, a análise microbiológica poderá apontar algum indicador de futura baixa em sua qualidade, permitindo que o agrônomo indique medidas preventivas para evitar que isto ocorra.

Assim, o tripé para suportar análise de um solo está pronto: física, química e microbiologia, permitindo que o agricultor lance mãos das tecnologias disponíveis tendo as melhores condições para obter elevadas produtividades e tirar o maior proveito de sua área de terra.

Este recurso está à disposição de todos. A metodologia de análise, inédita no mundo, já está disponível para uso em diversos laboratórios de análise de solo, podendo ser acessado pelos agricultores do cerrado. Por hora a análise está calibrada para o Bioma Cerrado, mas em breve estará pronto para uso em outras regiões.

Desta forma,  a ANPII vem reforçar a necessidade de termos as boas instituições de pesquisa e os bons pesquisadores fortalecidos, pois as pesquisas tem trazido benefícios imensuráveis para a sociedade brasileira.

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